quinta-feira, 30 de junho de 2011

As possíveis ramificações da Súmula 237 do Superior Tribunal de Justiça

Por Gustavo Fonseca.

Há quase dez anos o STJ publicou a Súmula de n.° 237 através da qual pacificou o seu entendimento acerca da não inclusão dos encargos financeiros inerentes a operações com cartões de crédito na base de cálculo do ICMS. Mas os fundamentos utilizados pela Corte Superior podem ter implicações bem mais abrangentes que aquelas que o seu próprio enunciado encerra.

Com efeito, as decisões que serviram de supedâneo jurisprudencial para a consolidação da aludida súmula firmaram-se no sentido de que as taxas de juros e, principalmente, as taxas de administração cobradas dos comerciantes e repassadas por estes ao consumidor usuário do cartão de crédito, decorreriam de outra relação jurídica distinta da verificada na operação de circulação de mercadoria ou de prestação de serviços de transporte intermunicipal ou de comunicação (que compõem a hipótese de incidência do ICMS).

E aqui se pode extrair importante conseqüência do entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça: ao afirmar que os encargos financeiros decorrentes do uso do cartão de cartão de crédito e repassados ao consumidor final não integram a base de cálculo do ICMS, abra-se um precedente para se afirmar, também, que as taxas de administração e os juros cobrados nas vendas realizadas com cartão não comporiam receita de vendas dos comerciantes.

Ato contínuo, seria possível dizer-se que nas vendas realizadas com cartão de crédito nenhum valor que não seja próprio da operação de circulação de mercadoria ou de prestação de serviço integraria, a nosso sentir, para quaisquer fins, a receita bruta operacional do comerciante ou prestador de serviço, seja para fins de exigência e recolhimento do ICMS, como entendido pelo STJ, seja para os fins de cálculo e recolhimento de quaisquer tributos e/ou contribuições que tenham como elemento de sua base de cálculo a receita bruta dos contribuintes – incluindo-se aí a contribuição para o PIS, a COFINS, o IR e a CSLL calculados pelo sistema de lucro presumido e, até mesmo, as parcelas do SIMPLES Nacional.

Por óbvio, o raciocínio acima é absolutamente ignorado pelos órgãos de arrecadação e temos certeza de que, caso seja lançada a questão, a Receita Federal a combaterá fervorosamente, o que deixa ao contribuinte a via única e exclusiva do Poder Judiciário que, caso acate a tese, e a depender da realidade fática do empresário, poderá garantir ao cidadão considerável economia tributária.

Sobre a fonte
Gustavo Fonseca é especialista em Direito Tributário e Direito Administrativo. Atualmente, é sócio do escritório Silveira, Fonseca e Cerqueira - Advogados Associados - Avenida Afonso Pena, 2770, sala 1005, Funcionário, BH/MG. Telefone: (31) 3221-6407.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS GERAM INDENIZAÇÃO PARA PROPRIETÁRIO E LOCATÁRIO

Por Daniel Cerqueira.



Fundo de comércio também tem direito à compensação porque desapropriação interfere na atividade comercial e pode comprometer sustento do locatário

A Prefeitura de Belo Horizonte decretou, como fim de utilidade pública, a desapropriação de imóveis próximos à Avenida Pedro I para suprir a demanda no aumento de tráfego e melhorar a infraestrutura viária local para a Copa do Mundo de 2014. Isso tem gerado muitos entraves tanto para proprietários quanto para  locatários de imóveis localizados nessa região, que, de acordo com o advogado especializado em Direito de Empresa, Daniel Cerqueira, devem ficar atentos para saber quem tem direito e como se dará a indenização pela desapropriação.

Ele explica que, tradicionalmente, a indenização é devida aos proprietários dos imóveis. Mas, considerando que grande parte dos imóveis instalados ao longo da Avenida Pedro I têm finalidade comercial, e os inquilinos também devem ter direito à compensação financeira. “Nesses casos, a desapropriação afeta também a atividade comercial do locatário, podendo comprometer seu sustento e até sua profissão. Por isso, em tese, há a possibilidade de o Poder Público indenizar o fundo de comércio, aqui definido como o conjunto de bens materiais e imateriais que dão valor agregado ao negócio, como o ponto comercial, por exemplo.”, diz o advogado.

Segundo ele, no entanto, há algumas divergências, na jurisprudência, no que se refere ao entendimento desse direito e é preciso que os empresários fiquem a par das situações. Atualmente, o judiciário considera três vertentes para analisar a situação. A primeira defende que o locatário deve ser indenizádo caso comprove que não conseguiu se restabelecer em outro lugar após a desapropriação. “Postos de gasolina, por exemplo, têm a viabilidade econômica diretamente relacionada com seu

posicionamento geográfico. Se um posto precisar ser instalado um quarteirão a frente, pode perder sua clientela e deixar de ser financeiramente viável”, exemplifica.

A segunda, segundo o especialista,  entende que, para haver indenização, o fundo de comércio deve ser protegido pela Lei de Luvas — legislação anterior à atual Lei de Locação que determina que, em caso de perda do imóvel, o proprietário deve indenizar o locatário do fundo do comércio. “Considero essa interpretação descabida, pois em 1991 a antiga lei de luvas foi substituída pela atual Lei de Locação”, argumenta Cerqueira. Já a terceira vertente estipula que o pagamento só é devido àqueles comerciantes que têm contrato de aluguel válido e com prazo determinado.

Para o advogado, é esse último entendimento que deve ser considerado para determinar os direitos de fundo de comércio indenizáveis. “Se o imóvel está localizado em regiões com o mesmo perfil daqueles encontrados na Av. Pedro I, cabe indenização tanto para o proprietário, pela perda do imóvel, quanto para o locatário, pela perda do ponto comercial. E se o proprietário desenvolve alguma atividade comercial no próprio imóvel, a compensação deverá ser maior em função da posse e finalidade com o qual é utilizado”, afirma Cerqueira, completando que, no caso do locatário, duas alternativas são possíveis para receber a indenização.

“Em ações de desapropriação indireta, quando o proprietário entra na Justiça contra o Poder Público, um entendimento diz que o locatário não poderia participar do processo porque não é dono do imóvel. Então, ele deve entrar com uma ação autônoma apensa ao processo de desapropriação alegando perdas e danos. No entanto, uma outra interpretação oferece ao locatário a possibilidade de participar da própria ação de desapropriação ao lado do dono do estabelecimento, já que ambos estarão defendendo interesses comuns”, informa.
Processos judiciais
Daniel Cerqueira explica também que os processos de desapropriação de utilidade pública nascem e costumam ser marcados pelo desentendimento entre o valor oferecido pelo Poder Público e aquele exigido pelo proprietário. “Quando, por exemplo, não há acordo dentro do processo de desapropriação direta ou indireta, um perito, nomeado pelo juízo, faz a avaliação do imóvel e determina a indenização a ser paga, sendo que nestes casos juiz costuma homologar em sentença o valor encontrado pelo perito. O problema é que a Ação Judicial sem acordo pode levar anos para ser concluída, principalmente por que elas são submetidas ao expediente do reexame necessário, ou seja, ainda que o Poder Público concorde com os valores determinados em sentença a decisão do juiz de primeira instância vai ao Tribunal.”, completa.

Sobre a fonte
Daniel Cerqueira é advogado especialista em Direito de Empresa. Atualmente, é sócio do escritório Silveira, Fonseca e Cerqueira - Advogados Associados - Avenida Afonso Pena, 2770, sala 1005, Funcionário, BH/MG. Telefone: (31) 3221-6407.

terça-feira, 28 de junho de 2011

O Projeto de Lei 625/2011 - e a ampliação do direito de arrependimento.


O Projeto de Lei 625/2011, em tramitação na Câmara dos Deputados, em Brasília, prevê a devolução de um produto em caso de arrependimento de qualquer compra e está causando muita polêmica entre consumidores e os lojistas.

Hoje, o consumidor só tem essa garantia em transações não presenciais, realizadas pela internet ou por telefone, segundo o artigo 49, da Lei 8.078. A proposta do projeto  é ampliar o direito também para as compras presenciais, de sorte a assegurar o ressarcimento integral do valor pago na compra, desde que haja a devolução do produto nas mesmas condições de retirada em loja, em até 48 horas.

A polêmica gerada deve-se à redação dada ao dispositivo, muito ampla e genérica, não se dignando o legislador especificar, na norma em elaboração, quais os requisitos para o exercício do direito de arrependimento, dentro do prazo estipulado.

Defendo o projeto, ressalvando, nada obstante, a necessidade de serem estipulados limites para o exercício dos direitos ali dispostos. Não se pode desconsiderar que as pessoas, atualmente, são bombardeadas pelos apelos publicitários, muitas vezes comprando produtos por mero impulso, sem refletir sobre a real necessidade daquele bem em sua vida. A falsa facilidade em relação ao parcelamento também colabora para o consumismo.

Para o empresário, a falta de regulamentação pode gerar problemas, porquanto pessoas, infelizmente, agem de má fé.

Vale, portanto, ficar atento à proposta legislativa em comento, uma vez que esta, certamente, promoverá profunda alteração nas relações de consumo hoje existentes 

Sobre o PL 625/2011 -  autoria do deputado Jorge Tadeu Mudalen - DEM /SP e  acrescenta o art. 49-A à Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, que dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. O mesmo garante ao consumidor o direito ao arrependimento imotivado da compra feita tanto no estabelecimento comercial quanto na Internet, dentro de quarenta e oito horas da data da compra.

domingo, 26 de junho de 2011

IRPJ e CSLL – lucro presumido – para prestadores de serviços hospitalares: entendimento final do STJ e suas repercussões.


As pessoas jurídicas optantes pela tributação com base no lucro presumido efetuarão o cálculo do IRPJ e da CSLL mediante a aplicação de um percentual sobre a soma da receita bruta da sua atividade operacional e das demais receitas, resultados e ganhos.

Em tais casos, os índices a serem aplicados vêm definidos no art. 15 da Lei nº 9.249/95, que, até o advento da recentíssima Lei 11.727 de 23 de junho 2008, ostentava a seguinte redação:

Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante a aplicação do percentual de oito por cento sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto nos arts. 30 a 35 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995.
§ 1º. Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será de:
(...)
III – trinta e dois por cento, para as atividades de:
a) Prestação de serviços em geral, exceto serviços hospitalares.[1];

Destarte, é de se notar que, pela redação acima, o legislador pátrio contemplou as pessoas jurídicas prestadoras de serviços hospitalares com uma forma de tributação menos gravosa em relação àquela incidente sobre as atividades de prestação de serviços em geral.

Entretanto, ante a ausência da definição legal do que seriam considerados “serviços hospitalares”, constatou-se necessária a regulamentação da matéria, o que, contudo, somente aconteceu em 2003, com e edição da IN/RFB 306/2003, pela qual a Administração Tributária Federal firmou seu entendimento acerca da locução “serviços hospitalares”, para efeito da incidência das exações em questão.

A norma infralegal supra foi revogada pela IN/RFB nº 480/04, que, ao exigir, em seu art. 27 número mínimo de leitos para a internação de pacientes, extrapolou os ditames da Lei 9.249/95, eivando-se, pois de toda ilegalidade.

O dispositivo foi alterado pela IN/RFB nº 539, de 25 de abril de 2005, que mesclou as orientações antecedentes, também exigindo dos contribuintes capacidade de realizar internações.

Finalmente, a IN RFB nº 731, de 10 de dezembro de 2007 conferiu a atual redação do art. 27 da IN RFB 480/04.

Em comum, os prefalados atos indicam estreita relação entre o conceito de “serviços hospitalares” e a idéia de internação. 

Por evidente, as diversas interpretações dadas à locução geraram indesejáveis conflitos entre o fisco e os contribuintes. O Poder Judiciário foi, assim, chamado a promover o deslinde da questão.

Se, de um lado, o fisco conferia interpretação restritiva ao termo, consignando que, a seu juízo, serviço hospitalar seria somente aquele prestado por hospitais, noutro, aduziam os contribuintes que a expressão “serviços hospitalares” deveria abarcar todos aqueles relativos à assistência à saúde, prestados por hospitais ou não.            

A matéria chegou, então, ao Superior Tribunal de Justiça, que, ao apreciar o Resp. 951.251/PR, decidiu, mediante entendimento exarado pela 1ª Seção daquela E. Corte, que, a despeito dos argumentos da entidade fazendária, o referido benefício fora concedido de forma objetiva, sendo, assim, irrelevantes questões afetas aos contribuintes.

Com efeito, a aplicação do dispositivo em tela estaria totalmente desvinculada da existência de estrutura que possibilitasse internação de pacientes.

Vale dizer, portanto, que, segundo atual e definitivo entendimento daquele Tribunal, a Lei 9.249/95 não fez nenhuma exigência quanto à pessoa contribuinte, o que desautoriza ato infralegal a fazê-lo. Assim, é de se sustentar que serviços hospitalares são aqueles relacionados aos prestados em hospitais, podendo ser realizado em estabelecimento hospitalar, clínica médica, laboratórios ou similares, independentemente da estrutura disponibilizada, sendo excluídos, desta disposição, SOMENTE, as consultas médicas feitas por profissionais liberais.[2] 

Pensamos que o a decisão acima harmoniza com a vontade do legislador e vai de encontro à melhor exegese da norma tributária, garantindo aos contribuintes a possibilidade de postular em juízo o direito de verem inseridos no aludido “benefício”, o que poderá representar grande economia fiscal, sem prejuízo da restituição de tudo aquilo que fora indevidamente pago ao fisco nos últimos 5 anos.

A guisa de esclarecimento, é importante mencionar que a Lei 11.727/08 alterou a redação do art. 15 da Lei 9.249/95, estendendo, em relação ao texto original, o rol de serviços abrangidos pelo benefício fiscal em questão, impondo, contudo, a exigência de constituição da pessoa jurídica na forma de sociedade empresária, ressalvando-se, no entanto, que o novel Diploma não se aplica aos fatos geradores anteriores a sua vigência.


[1] No mesmo sentido preconiza o art. 20 da mesma Lei: Art. 20. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, devida pelas pessoas jurídicas que efetuarem o pagamento mensal a que se referem os arts. 27 e 29 a 34 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995, e pelas pessoas jurídicas desobrigadas de escrituração contábil, corresponderá a doze por cento da receita bruta, na forma definida na legislação vigente, auferida em cada mês do ano-calendário, exceto para as pessoas jurídicas que exerçam as atividades a que se refere o inciso III do § 1o do art. 15, cujo percentual corresponderá a trinta e dois por cento.
[2] O que, aliás, está expresso no julgado em questão.