quinta-feira, 7 de julho de 2011

ICMS-ST: e a exceção virou regra.


Por Gustavo Guimarães da Fonseca

Quando do julgamento do Recurso Extraordinário de nº 213.356/SP, o Supremo Tribunal Federal, em decisão eminentemente política, justificou o injustificável e reconheceu a validade, em face do texto constitucional, do famigerado instituto da substituição tributária “para frente”, em que determinado tributo é exigido de uma terceira pessoa (que não contribuinte), antecipadamente (isto é, antes da ocorrência do fato que, em tese, geraria a obrigação, mediante o uso de uma base de cálculo presumida, pré fixada pela legislação de regência).

Naquela ocasião, o então Ministro Ilmar Galvão, relator do acórdão, apoiou a sua decisão no caráter excepcional do deslocamento da responsabilidade tributária, lembrando, inclusive, a partir das advertências da doutrina majoritária da época, a necessidade do “extremo cuidado do legislador” ao optar por este “regime” de sorte que “não se vulnerem os desígnios constitucionais” que norteiam a própria atividade fiscal-tributária. Nada obstante, e contrariando a própria doutrina por ele suscitada, decidiu pela conformação do regime com o texto constitucional, lastreando seu entendimento, exclusivamente, numa premissa metajurídica: o pragmatismo.

Isto é, a despeito das advertências dos mais reconhecidos juristas nacionais, e a despeito da inconstitucionalidade gritante deste regime, alçando a “praticidade” ao status de princípio, o Supremo Tribunal Federal entendeu como válida a Substituição Tributária justamente por tornar mais eficiente o processo de arrecadação pela concentração dos esforços fiscalizatórios em apenas uma etapa da cadeia produtiva, ainda que, sempre, sob a advertência do uso comedido do regime e sempre em caráter excepcional.

Observa-se, hoje, contudo, é que pouquíssimos, são, os produtos que submetem à regra ordinária de tributação (débito x crédito), tornando exceção o que antes era regra. Isto é, uma vez reconhecida a legitimidade do regime de substituição tributária, os Estados não se fizeram de rogados e, atropelando as advertências do próprio Supremo (excepcionalidade do uso deste regime), estenderam de forma irresponsável tal forma de tributação à maioria das operações contempladas pela hipótese de incidência do ICMS.

O que ninguém parece se aperceber, incluindo-se aí o próprio Supremo Tribunal Federal, é que a predita “eficiência” que o regime encerra, encontra muito mais sustentação no aumento da alíquota real do imposto que na própria facilidade operacional que a ST enseja – ou ensejaria. Ou seja, o uso da ST, hoje, não se justifica na “praticidade” aludida pelo Ministro Ilmar Galvão – a prova maior disto está na crescente imposição de obrigações acessórias (envio de relatórios, uso de programas fiscais, envio de declarações, etc.) aos contribuintes substituídos tributários (cujo ICMS é recolhido antecipadamente pelo contribuinte substituto) que, em tese, não teriam a “preocupação de ordem tributária, desobrigados que ficam “do recolhimento do ICMS” (trecho extraído do voto do Min. Ilmar Galvão, citado no início deste artigo) -, mas, isto sim, no aumento real da carga tributária relativa ao ICMS, provocado, notadamente, pelo uso de base de cálculo presumida que, invariavelmente, supera, e muito, o preço final efetivamente praticado (que seria a base de cálculo do ICMS, caso este fosse recolhido num regime ordinário – débito x crédito – de tributação).

Em resumo, se, quando da análise da discussão pelo Supremo Tribunal Federal, validou-se o regime em tela, exclusivamente, pela praticidade que ele encerrava, a realidade fática atual aponta para motivos bem menos nobres; se esta discussão, no entanto, será reaberta, só o tempo dirá; o fato é que o setor produtivo nacional, considerando-se apenas o sistema constitucional tributário, já sofre com excessos tributários, sem que os Estados utilizem-se de subterfúgios para aumentar a sua arrecadação, o uso desmedido da ST só serve, de fato, para tornar ainda mais sofrível a situação deste setor, aumentando, sobremaneira, o chamado “custo-brasil”.

Passou da hora de se dar uma basta... seja pelo Poder Judiciário, seja através do legislativo...

Sobre a fonte:

Advogado em Belo Horizonte e Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Milton Campos, Assessor Jurídico do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo em Minas Gerais – Minaspetro - e Conselheiro Jurídico da Associação do Comércio de Minas Gerais - ACMINAS

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